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Como o estresse afeta a produtividade das lavouras?

14 de junho de 2024

A capacidade de uma planta crescer e sobreviver sob estresse depende de sua habilidade em adaptar o crescimento e os seus processos fisiológicos e metabólicos, que são regidos por complexas redes de sinalizadores e reguladores moleculares.

Uma das melhores definições de estresse vegetal foi apresentada pelo pesquisador John Boyer, em 1982, em que ele definiu estresse como “qualquer condição ambiental que impeça a planta de expressar seu potencial genético pleno, por exercer uma influência negativa sobre a planta”.   

Logo, o estresse afeta ou bloqueia o metabolismo, crescimento ou desenvolvimento das plantas, resultando em perdas de produtividade.

O estresse pode ter uma causa natural, proveniente do ambiente onde a planta vive, sendo classificado como biótico (causado por um ataque de pragas) ou abiótico (causado por uma mudança no ambiente), ou ainda ter uma causa resultante de uma intervenção de manejo feita por nós. 

Veja alguns exemplos de estresse que podem afetar as plantas:

Fatores naturais de estresse:

  • Alta irradiância (fotoinibição, foto-oxidação);
  • Calor (aumento da temperatura);
  • Baixa temperatura (resfriamento);
  • Geada;
  • Escassez de água;
  • Deficiência nutricional;
  • Longos períodos chuvosos;
  • Ataque de insetos;
  • Patógenos virais, fúngicos e bacterianos.

Fatores de manejo:

  • Uso de herbicidas, inseticidas, fungicidas;
  • Poluentes atmosféricos (por exemplo, SO2, NO, NO2, NOx);
  • Ozônio (O3) e poluição fotoquímica;
  • Formação de espécies de oxigênio altamente reativas (O2, radicais O2 e OH, H2O2);
  • Foto-oxidantes (por exemplo, peroxiacilnitratos);
  • Chuva ácida, neblina ácida, orvalho ácido da manhã;
  • pH do solo e da água;
  • Deficiência ou excesso de nutrientes no solo;
  • Carga de metais pesados (chumbo, cádmio, níquel, etc.);
  • Aumento da radiação UV (UV-B e UV-A);
  • Aumento de CO2, alterações climáticas globais.

Vale a pena ressaltar que nem todo estresse chega a ser negativo. Alguns tipos de estresse atuam como sinalizadores e promotores, como ocorre na indução da florada das plantas. Podemos chamar esse tipo de estresse “positivo” de Eu-estresse

O grande problema do estresse ocorre quando ele apresenta uma intensidade severa e com uma duração prolongada, como uma seca prolongada. Chamamos esse estresse de Dis-estresse.

Como as plantas respondem ao estresse?

As plantas possuem vários mecanismos para se defender do estresse, porém a ativação desses mecanismos acontece devido a uma sinalização ambiental. Antes da exposição ao estresse, as plantas estão num ótimo padrão de fisiologia dentro dos limites estabelecidos pelas condições de crescimento, luz, água e nutrição mineral. 

Eventos estressantes levarão a planta a apresentar uma resposta fisiológica, sendo que esta resposta pode ser dividida nas fases de (1) alarme, de (2) resistência, de (3) exaustão e mais tarde para a fase de (4) regeneração, após a remoção do estresse se o dano não tinha sido muito grave.

  1. Fase de alarme: na fase de alarme, ocorre o início da fase de resposta ao estresse, em que  é observado o desvio da normalidade, ou seja, as plantas saem de sua condição favorável. Perda da estabilidade das estruturas (membranas das células, por exemplo) e das funções que mantêm as atividades vitais (fotossíntese comprometida). Os processos catabólicos (degradação do metabolismo) excedem os anabólicos (promotores do metabolismo), uma intensificação muito rápida do fator estressante causa danos agudos na integridade celular, antes de medidas de proteção serem ativadas pela planta.
  2. Fase de resistência: na fase de resistência, rapidamente a planta começa a ativar os processos de adaptação e reparo dos danos causados, como síntese de enzimas, proteínas ou outras substâncias de proteção. Essa fase leva a planta a entrar em resistência e combate ao estresse e aumenta sua intensidade de acordo com o aumento da sinalização do estresse. Devido a essas respostas, a planta adapta sua fisiologia e metabolismo para conviver com o estresse sofrido. A resistência pode permanecer elevada por algum tempo após o distúrbio ter ocorrido.
  3. Fase de exaustão: Caso o estresse prolongue ou aumente a sua intensidade, superando os mecanismos de defesa das plantas, começa a ocorrer a fase de exaustão, onde importantes eventos fisiológicos como a fotossíntese, a respiração e a síntese proteica entram em colapso, deixando a planta debilitada e suscetível ao ataque de patógenos, podendo levar a sua morte.
  4. Fase de regeneração: chegando ao fim do processo de resposta, caso os mecanismos de defesa da planta ao estresse sejam efetivos e promovidos por ações de manejo que amenizem os impactos dos fatores estressantes, a planta chega a fase de regeneração, podendo ser parcial ou completa, das funções fisiológicas.

Quais são as ferramentas que as plantas usam para diminuir os problemas causados pelo estresse?

Para diminuir os efeitos negativos do estresse, as plantas desenvolveram uma variedade de mecanismos para proteger sua fisiologia e seu metabolismo. Alguns desses mecanismos são descritos abaixo:

Ativação de fatores de sinalização: Quando as plantas enfrentam estresse, os sensores são ativados para iniciar rotas de transdução de sinais, mediando a necessidade do desenvolvimento da planta conforme sua condição atual.

Alteração da expressão gênica: As plantas podem alterar a expressão de seus genes em resposta ao estresse, permitindo-lhes adaptar-se às condições adversas.

Acumulação de solutos compatíveis: Os solutos compatíveis ajudam a manter a turgescência celular e a estabilidade das proteínas e membranas em condições de estresse.

Síntese de proteínas de estresse: As proteínas de estresse ajudam a proteger as plantas contra danos causados por condições de estresse.

Metabolismo antioxidativo aprimorado: As plantas podem aumentar a produção de antioxidantes para combater o estresse oxidativo.

Homeostase de íons e compartimentação: As plantas podem regular a concentração de íons dentro de suas células para manter a homeostase em condições de estresse.

Transporte de membrana facilitado: As plantas podem alterar o transporte de substâncias através de suas membranas em resposta ao estresse.

Acumulação de poliaminas: As poliaminas são pequenas moléculas que as plantas podem acumular em resposta ao estresse para ajudar a proteger suas células.

Além disso, as plantas podem desenvolver mecanismos de defesa para mitigar danos fisiológicos devido a compostos bioquímicos danosos altamente produzidos em situações de estresse. Elas também podem promover o desenvolvimento radicular, preparando a planta para adquirir água e nutrientes em profundidade.

As plantas estão constantemente expostas a fatores estressantes, logo parte considerável de sua energia é direcionada para ativação de mecanismos de proteção. Desta forma, conhecer o ambiente produtivo e as interações da planta com ele é um fator chave para se manejar o estresse corretamente.

Construir ambientes produtivos que sejam base para um bom desenvolvimento das plantas e promover plantas que interajam melhor com os fatores estressantes é uma forma dos agricultores direcionarem o manejo de suas lavouras.

Devemos nos atentar para construção de um bom perfil de solo, bem drenado, com boa aeração, com boa capacidade de reter água e nutrientes, pH corrigido, com bom teor de matéria orgânica e com grande variabilidade de microrganismos. Porém, devemos nos atentar também para a construção de plantas fortes e saudáveis, que tenham a capacidade de explorar esse perfil de solo, com grandes volumes de raízes, com boa arquitetura de folhas e elevada capacidade fotossintética, que tenham a capacidade de gerar grande volume de flores e com altas taxas de pegamento, resultando em maior quantidade de frutos e grãos, resultando em maiores produtividades.  

Não podemos dizer que um fator é mais importante que o outro, somente focando em construir perfil do solo e não dando a devida atenção para promover e proteger a fisiologia da planta, e nem tão pouco focar somente no manejo fisiológico da planta sem olhar para o solo. Está tudo interligado!

Manejar o estresse em plantas exige muita sabedoria e humildade! Devemos conhecer nossas lavouras, identificar os pontos que causam estresse, entender como eles interagem entre si e como afetam a fisiologia e metabolismo das plantas. Entendendo isso, podemos criar opções de manejo que minimizem perdas e aumentem a produtividade. Não devemos nunca esquecer que o nosso foco é a planta.

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Referências

Lichtenthaler. Vegetation Stress An Introduction to the Stress Concept in Plants. Journal of Plant Physiology, 1996.
Lichtenthaler. The Stress Concept in Plants: An Introduction. Annals New York Academy of Sciences, 1998.
Prof. Flávio Rabelo, Aula Nutrição de plantas para modulação de crescimento e mitigação de estresses, 2023.

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